Muito tem se falado – ou gritado – na web a respeito da polêmica decisão do Rip Curl Pro Portugal 2012, que deu a vitória de última hora para Julian Wilson em cima de Gabriel Medina.
Pode se dizer que já está bem claro que algo deu errado durante o julgamento daquela bateria, principalmente pela derradeira onda que valeu 8.43 de Julian Wilson. Mas o que exatamente?
As mesmas velhas acusações direcionadas à ASP voltam a impregnar as páginas das mídias sociais, enquanto as mesmas velhas desculpas são usadas para anular qualquer protesto em relação ao julgamento do surf de competição.
A ASP é sim uma entidade australiana e, não há nada que vá mudar isso; Competidores sempre irão comemorar seus feitos, não há maneira – ou mesmo intenção – de controlar isso; Surfistas brasileiros são sim mal vistos pelas potências internacionais com o surf mais enraizado em suas culturas – EUA e Austrália mais especificamente –, é uma questão de gosto e tradição, o Brasil ainda emerge no cenário mundial e nosso estilo, dentro e fora d’água, é diferente daquele que estas nações vislumbram glorificar.
Pois bem, diante destas premissas, alguns pontos ainda podem ser atacados de forma construtiva, sem dar de frente com as velhas desculpas – a subjetividade do surf, o elemento estilo em cada execução de manobra, o tal erro humano e o famoso bordão usado por comentaristas e figuras comprometidas demais com o meio: “… mas eu não sou juíz pra saber”.
1. Antes de qualquer coisa, é inaceitável que a comemoração dos surfistas – e do público – interfira com a nota de uma onda surfada. A culpa não é de quem comemora, e sim do juiz que se deixa influenciar pelo chamado “claim”. Por mais que seja muitas vezes um reflexo natural, a artimanha é usada abertamente por competidores para inflar suas notas.
O Surfline citou pelo Twitter a seguinte declaração de Julian Wilson a respeito de sua última onda no Rip Curl Pro Portugal 2012: “É meio pesado comemorar um 5, mas…”. Não é a primeira, e certamente não será a última declaração que comprova a eficácia do método mais fácil de ludibriar o julgamento da ASP.
2. Mais do que um critério que todos concordem – algo praticamente impossível de se alcançar – a ASP precisa urgentemente de uma coerência maior em relação ao critério usado em seu julgamento. Quando Adriano de Souza foi favorecido durante o Billabong Pro Rio 2011 contra Owen Wright, com aquele polêmico floater – claim, praia lotada e atleta competindo em casa, uma combinação perigosa para o julgamento da ASP –, a associação optou por fazer um pronunciamento inédito, justificando a nota dada para aquela onda.
Enquanto muitos esperam um novo pronunciamento da ASP, agora em relação à decisão entre Medina e Julian em Peniche, seria extremamente decepcionante assistir a repetição desta burrada, pois ao se pronunciar, o comitê de julgamento está praticamente comprovando o erro cometido mas se negando a assumir a culpa. Não há como explicar o inexplicável, porém, vamos analisar um trecho da nota oficial da ASP sobre aquele episódio do ano passado:
Os surfistas devem se adaptar aos fatores-chave de julgamento da ASP para maximizar seu potencial de pontuação.
Juízes analisam os seguintes fatores-chave quando pontuando ondas:
– Comprometimento e grau de dificuldade
– Inovação e manobras progressivas
– Combinação de manobras principais
– Variedade de Manobras
– Velocidade, Potência e Fluidez
A ASP precisaria se contradizer quase por completo em uma nova nota, para justificar o acontecido na final em Peniche.
Todos estes critérios favorecem claramente Gabriel Medina mais do que Julian Wilson naquela bateria. Particularmente na última onda da final, onde Julian não atende a quase nenhum dos critérios enfatizados aqui.
O mínimo que se pode esperar da ASP são novas providências no intuito de corrigir o erro no futuro e, quem sabe, um pedido de desculpas que seria não só apropriado, como coerente em relação ao novo critério de julgamento lançado este ano.
3. Não há dúvidas de que o julgamento de performance no surf é algo subjetivo, assim como em outros esportes. O sistema de julgamento da ginástica artística, particularmente, chama a atenção. Desde sua reformulação em 2004, após protestos sobre favorecimentos nas Olimpíadas de Atenas, o processo é dividido pela avaliação de duas bancas de juízes. A primeira julga o valor das séries, e a segunda banca (com um sistema bem parecido com o da ASP hoje, sendo um grupo de juízes, a maior e a menor nota são descartadas e uma média é tirada entre as notas intermediárias) avalia a execução das séries. No final, o que vale é a soma das duas notas.
Adaptando esse sistema ao surf, poderíamos ter uma “nota de partida” para cada manobra, e um adicional para a execução da mesma (levando em consideração o estilo, a onda, ou algum diferencial apresentado pelo surfista). Que tal?
Desta forma, cada nota inflada teria uma justificativa e os favorecimentos inapropriados se tornariam cada vez mais difíceis, tendo um destaque muito mais explanado. Os juízes teriam que seguir uma espécie de tabela pré-definida de pontuação para cada variação de manobra, evitando surpresas tão grandes quanto o 8.43 pontuado por Julian Wilson com um “meio tubo” e algumas rasgadinhas insignificantes.
Esta seria uma maneira também de eliminar de vez aquela desculpa de estar favorecendo o surfista mais merecedor da bateria no geral, usada pela ASP ao julgar ondas decisivas de forma duvidosa. Afinal, se esta preocupação realmente existisse, provavelmente toda a bancada de julgamento teria dado a vitória do Rip Curl Pro Portugal 2012 a Gabriel Medina.
Você tem uma ideia também? Comente com sua opinião, mas sem antes conferir algumas outras opiniões de peso lançadas no Twitter: