Gabriel Medina venceu o Nike Lowers Pro 2012 com uma performance que pode ser considerada a melhor já vista em um campeonato de surf profissional até hoje. Desta vez o garoto extrapolou. Depois de tantas demonstrações de seu talento, aclamadas de forma fria pela mídia e o cenário do surf mundial, neste campeonato Medina deixou sua superioridade tão clara que seria quase infantil para o mundo do surf não se render ao novo.
Eu, pessoalmente, não sou adepto da assimilação do surf brasileiro de hoje com o futebol, do Medina com o Neymar, e assim por diante. Na verdade, a atitude e a abordagem que nosso time verde e amarelo tem no surf é tão diferente do time de chuteiras que a comparação seria injusta. Somos uma nação naturalmente competitiva. Talvez isso tenha sido uma consequência de nossa paixão pelo futebol. Mas ao mesmo tempo, nosso “título” de país do futebol e essa paixão desenfreada, nos tornaram mimados. No que diz respeito a futebol, esperamos nada menos que a vitória. Somos metidos, somos superiores e não precisamos da aceitação de nossos adversários… somos convencidos!
Nossos surfistas hoje representam exatamente o contrário disso tudo. No surf, sempre fomos os “underdogs”, a “zebra”, e todo apaixonado por competição sabe o quanto é legal torcer para o improvável.
O interessante deste campeonato foi a ausência da transmissão em português no webcast ao vivo. Caiu como uma luva! Todos fomos obrigados a escutar a narração de uma transmissão que insistia em exaltar a performance de John John Florence, enquanto Gabriel Medina silenciosamente alcançava as maiores pontuações do campeonato. Ao final, a rendição ao fenômeno – sem conotação futebolística! – brasileiro foi inevitável.
Durante a bateria de Medina, Dane Reynolds e Daniel Ross, tivemos que assistir ao replay do aéreo – monstro – de John John Florence repetidamente por metade de seu tempo de duração, enquanto Medina acumulava múltiplas ondas na casa dos 9 pontos, muitas não transmitidas ao vivo.
O que marcou o começo do “reconhecimento” dos narradores e comentaristas gringos do webcast foi a performance de Medina contra Brett Simpson, virando a bateria de forma espetacular com apenas 55 segundos restantes no cronômetro e precisando de um 8.47.
Isso é algo que não estamos acostumados. Normalmente batemos na trave, torcemos até o último minuto, mas a pressão de ter as esperanças de todos nós depositadas em uma última cartada, um “tudo ou nada” nos instantes finais de uma bateria, é demais para qualquer um. Não para Medina! Por algum motivo inexplicável, o garoto parece não se afetar por todo esse nervosismo que envolve só o fato de assistir a uma bateria como essa, quem dirá protagonizá-la. Ele acerta pelo menos 90% de todas as manobras que arrisca e dessa vez, com o aéreo monstro que soltou logo de cara em sua última onda não foi diferente e lhe rendeu uma nota 9.53 e sua passagem para as quartas contra Dane Reynolds.
Depois da queda de John John, contra o irlandês Glenn Hall, Gabriel Medina era o dono da festa oficialmente e, diferentemente do futebol brasileiro, tirou um 10 – contra Ace Buchan, nas semis – e venceu o campeonato de forma comprometida porém humilde, sendo carregado ao final do campeonato pela torcida mais “apaixonada” que o surf já viu.
Sim, “apaixonada” é o termo usado pelos gringos. Mesmo se você não fala inglês, deve ter reparado as palavras “brazilian” e “passion” sendo usadas na mesma frase constantemente. O curioso é que todos gostamos – apesar das críticas – de assistir a campeonatos de surf de alto nível. Quem não mostraria “passion” assistindo à performance de Occy, aos 46 anos de idade, quase chegando às quartas de finais com um backside de dar inveja a qualquer um no tour? No caso dos brasileiros, a palavra é usada por comentaristas, surfistas, competidores, narradores quase como um sinônimo de maluquice. Como se na verdade isso tudo não importasse tanto assim.
Nas palavras de Marcelo Camelo:
“É simples desse jeito
Quando se encolhe o peito
E finge não haver competição
É a solução de quem não quer
Perder aquilo que já tem
E fecha a mão pro que há de vir”
Na verdade os aussies são extremamente competitivos, assim como nós. Foram eles que inventaram o campeonato mundial e sempre tiveram alguns dos melhores surfistas do mundo. Isso é parte da cultura deles, eles tem um estilo polido e surfam ondas de alto nível desde muito cedo. Porém, assim como nós no futebol, atualmente estão acomodados, enquanto nossos surfistas chegaram junto e cada vez mais são recompensados pelo que estão acostumados a fazer desde muito cedo: surfar qualquer tipo de onda, na raça! É difícil aceitar que uma nova era está chegando no surf, quicando e balançando os braços, preparando para decolar.
Já que todos nós conhecemos a opinião dos americanos e australianos sobre o surf de nossos representantes, achei que seria válido dar a opotunidade para eles conhecerem o ponto de vista de um de nós a respeito do assunto, pelo menos. Nada mais justo que fazer deste o primeiro post da Layback traduzido para o inglês.
English translation
Since we all know the opinion of american and australians about our surfing representatives, I though it was valid to give them the opportunity to know our point of view on the subject. So, here’s an english translation of the above:
Gabriel Medina has won the Nike Lowers Pro 2012 with a performance that can be considered the best ever seen in a surfing contest to this day. This time, the boy has gone too far. After so many demonstrations of his talent, acclaimed rather softly by the international media and the surf scene in general, this time Medina’s made his superiority so clear that it would be almost foolish of the surf world not to embrace it.
Personally, I am not a fan of the assimilation of today’s brazilian surfing with soccer, Medina with Neymar, and so forth. In truth, the attitude and approach that our “surfing team” has is so different from our ball players that the comparison would be unfair.
We are a naturally competitive nation. Maybe this has come as a consequence from our love for soccer. At the same time, our title of “Soccer Country” and this unrestrained love has also spoiled us. As far as soccer is concerned, we expect and accept nothing but the victory. We are cocky, we are superiors and don’t need the acceptance of our competitors… we are convinced!
Our surfers today represent exactly the opposite of all that. In surfing, we have always been the underdogs, the unexpected, and every competition lover knows how exciting it is to support the unlikely.
What was interesting about this contest was the lack of the portuguese webcast transmition. It fit like a glove for us! We all had to watch a narrative that praised John John Florence, while Gabriel silently reached the highest scores of the event. In the end, the rendition to the brazilian phenom – no conotation to Ronaldo here! – was inevitable.
During the heat between Medina, Dane and Daniel Ross, we had to watch the replay of John John Florence’s – massive – air through half of the heat time, while Medina posted multiple nines, many not commented or even transmitted live.
What marked the beginning of the “recognition” coming from the commentary booth was Gabriel’s spectacular comeback against Brett Simpson with only 55 seconds remaining on the clock and needing an 8.47.
This is something we are not accustomed to. Normally we “hit the post”. We believe until the very end but the pressure of having all of our hopes deposited into one last draw, an “all or nothing”, in the dying seconds of a heat is too much for anyone. Not for Medina! For some inexplicable reason, the kid seems to be unaffected by all this tension which is envolved in just watching a heat like that, not to mention to have the main role in it. He makes at least 90% of all manouvers he risks and, this time, with the air reverse he fully commited to right off the bat on his last wave, it was no different, and it granted him a 9.53 and a ticket to the quarters against Dane Reynolds.
After John John’s fall against the aussie/irishman Glenn Hall, Gabriel Medina officially owned that party, and differently from the brazilian soccer, he got a 10 – against Ace in the semis – and won the contest with much willingness but very humbly, being carried to the stage in the end by the most “passionate” crowd the surf world has seen.
Yes, “passion” is the term used by the gringos. Even if you don’t speak english, you must have noticed the words “brazilian” and “passion” being put together in the same sentence constantly. What’s curious is that all of us – despite the critics – love to watch high performance surf competition. Who would’nt show “passion” watching Occy, at 46 years of age, battling his way nearly to the quarters with a backside that would make most of the tour jealous? But when describing the brazilians, the word is used by hosts, commentators, surfers, competitors, almost as a synonym for “madness”. As if all this didn’t really matter that much anyway.
Actually, americans and especially aussies are extremely competitive people, just like us. They were the ones who invented the world championship and always had some of the best surfers in the world. It’s part of their culture, they have a polished style and surf high class waves since very early in life. However, just like our soccer, they are settled, while our surfers have made it to the point where they are getting valued for what THEY are used to since a very early age: surfing any type of wave in any way they can! It’s hard to accept that a new era is coming in surfing, swinging its arms and bouncing its way to a huge flight.